Opinião

“Bandeira Verde” na conta de luz nesse mês de janeiro foi um bom procedimento?

Tal como ocorreu no ano passado, com certeza em 2018 sistema elétrico brasileiro só será capaz de atender atuais demandas do país se houver forte complementação térmica

Por Fabio Couto

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O mecanismo das bandeiras (verde, amarelo, vermelha 1 e vermelha 2), foi criado em 2014, porém, por motivos eleitoreiros, foi implantado apenas em 2015, e teve a intensão de sinalizar ao consumidor o custo para gerar a energia suprida na ocasião e adiantar o valor para as distribuidoras que arcavam com os custos das térmicas e só depois, no reajuste das tarifas, é que eram ressarcidas. Como consequência, esperava-se a atenuação das dificuldades financeiras que a situação trazia para as distribuidoras e a diminuição do consumo de energia em períodos de alto custo.

A cor da bandeira está ligada a disponibilidade da energia hidráulica. Em períodos normais, com boa hidraulicidade (jargão técnico para boa quantidade de chuvas) e os reservatórios cheios e baixa geração térmica, a bandeira a ser decretada é a verde; em períodos de baixa hidraulicidade, mas os o nível da água nos reservatórios baixando mas sem chegar no volume crítico, a bandeira seria a amarela; em períodos de baixas hidraulicidade, com o nível da água nos reservatórios baixo, chegando no volume crítico e uma grande geração térmica, as bandeiras a serem decretadas são as vermelhas nível 1 nível 2.

De modo a haver o incentivo ao consumo consciente e economia de energia por parte do consumidor e, ao mesmo tempo, mitigar o custo da geração térmica, previu-se uma taxa ao consumidor, cujo valor é sinalizado pelas cores das bandeiras ou seja: período sinalizado com com a bandeira verde, não há acréscimo na conta, R$ 2,00 para cada 100 kWh consumido se a cor for amarela, R$ 3,50 para cada se a cor da bandeira for amarela vermelha-nível 1 e R$ 5,00 se for vermelha-nível 2.

Na verdade, trata-se de uma forma de recompor os gastos com a operação da usina termoelétricas, cujos custos são mais altos.

De acordo com a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), em matéria publicada no Estadão em 23/10/2017, até agosto 2017 a arrecadação dessa fonte de recurso foi de R$ 1,78 bilhão, insuficientes para cobrir o chamado risco hidrológico que no mesmo período havia sido da ordem de R$ 7,8 bilhões. Neste ano, a geração total do SIN foi de 65.361 MWm(³) e a parcela de geração termelétrica (excluída a fonte nuclear) foi de 13.064 MWm(³) ou 20% do total(³). Ou seja, a fonte que garantiu o atendimento da demanda de energia elétrica no ano passado foi a térmica.

Na mesma matéria somos informados que a diferença é coberta pelas distribuidoras e que por ocasião da revisão tarifária, os custos são internalizados na nova tarifa e, no final, é repassado ao consumidor!

A decretação da cor da bandeira é uma atribuição da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), e ela o faz baseado nas previsões hidrológicas e no planejamento da operação do sistema. E que faz os despachos das centrais é o Operador Nacional do Sistema (ONS), órgão responsável por monitorar os níveis dos reservatórios.

O mercado dos grandes consumidores alega que o que está errado é a formação do PLD por modelo matemático que é uma caixa preta muito sensível à previsão de chuva e extremamente volátil e defende uma formação de preço por mercado (oferta versus demanda), mas essa proposta ainda deverá demorar para evoluir.

Ora, em outubro de 2016 o sistema operou sob a sinalização da bandeira amarela. Os níveis dos reservatórios encontravam-se a níveis quase críticos, obrigando o operador a despachar as térmicas. Entretanto, devido a expectativa de chuva, não concretizada, em dezembro foi decretada a bandeira verde.

Apesar da boa quantidade de chuvas que tem ocorrido nesse duas primeiras semanas de janeiro, ainda não foram suficientes para recuperar os reservatórios no Brasil. Numa consulta à página do ONS, verifica-se que, conforme mostrado na Tabela 1, o volume de água acumulada nos reservatórios nos 4 subsistemas correspondem, no total, 27,44 % da capacidade de armazenado em todas as centrais hidrelétricas de regularização no país.

Tabela 1. Capacidade de armazenamento de energia dos reservatórios no Sistema Interligado Nacional, em janeiro de 2017

Situação em janeiro de 2017

Sub-sistema

Capacidade de Armazenamento
MWmês1
Participação no Sistema2 Níveis dos reservatórios1

Capacidade Armazenado2

Sudeste

203.342

73,47% 27,18%

19,97%

Sul

20.100

7,26% 62,65%

4,55%

Nordeste

51.809

18,72% 14,91%

2,79%

Norte

1.504

0,54% 24,29%

0,13%

Total

276.755

27,44%

  1. Dados Fornecido ONS, http://ons.org.br/pt/paginas/energia-agora/reservatorios;
  2. Calculado pelo autor

Em janeiro de 2017, a energia armazenada nos reservatórios foi quase 30% da sua capacidade máxima. O Brasil teve bandeira verde em janeiro e fevereiro, em março a bandeira amarela já havia sido decretada. Ou seja, .

Uma outra questão a se levar em conta quando se opera o sistema com os reservatórios vazios é que com os níveis da água muito baixos no e a vazões reduzidas resulta num cenário extremamente desfavorável para turbina pois, além de operarem com baixos rendimentos, as turbinas, em sua maioria, sofrem com problemas da “cavitação” que dificulta a operação das turbinas, causa danos às pás do rotor, aumentando a necessidade de manutenção das máquinas e diminuem a vida útil da máquina.

Ou seja, o recomendável, em tempos de racionamento hídrico em quase todo o país, seria ter decretada a bandeira vermelha em novembro tê-la mantida até o final deste mês de janeiro, concatenada à uma forte campanha junto à população para praticarem o consumo responsável, visando a economia da energia e, por extensão, da conta de luz no final do mês.

Em recuperando os níveis dos principais reservatórios, aí sim, decretar-se-ia a bandeira verde, não se esquecendo de continuar com a campanha para o consumo econômico e consciente.

Infelizmente, o que se viu foi no início de janeiro a implantação da bandeira branca, que além de estimular o consumo de energia, já que, se feita fora do horário de pico, o custo é mais baixo, e que desincentiva a implantação de pequenos sistemas de microgeração descentralizados. Mas essa já é uma outra conversa.

(¹) e (³) fonte ONS (http://www.ons.org.br/Paginas/resultados-da-operacao/historico-da-operacao/geracao_energia.aspx

Geraldo Lucio Tiago Filho é diretor do Instituto de Recursos Naturais e secretário-executivo do Centro Nacional de Referência em Pequenas Centrais Hidrelétricas (CERPCH) da Universidade Federal de Itajubá (Unifei).

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