Opinião

Encargos tarifários: botando ordem na casa

Por Claudio Sales

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Em um momento em que a população ainda se recupera de uma das mais profundas recessões da história do país, torna-se ainda mais importante disciplinar a concessão de benesses oferecidas a certos grupos de pressão às custas do resto da população.

Essa é uma questão especialmente pertinente no setor elétrico, já que os encargos setoriais foram o componente que mais contribuiu para a elevação das tarifas de energia elétrica nos últimos anos.

Entre 2012 e 2015, período em que os encargos setoriais atingiram seu pico, a participação destes encargos na tarifa de energia quase dobrou, passando a representar 15,4% da conta de energia elétrica. O encargo que mais contribuiu para essa elevação foi a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), cujas despesas anuais subiram de R$ 3,3 bilhões, em 2012, para R$ 21,8 bilhões em 2015, aumento de 560%.

O que explica o crescimento desenfreado dos encargos na conta de luz? Um dos fatores é a dinâmica parlamentar: deputados e senadores buscam iniciativas legislativas que lhes rendam frutos eleitorais, obtidos por meio de benefícios concentrados em um pequeno grupo que lhes assegura eleitores “fiéis”, mesmo que esses “benefícios” sejam à custa dos demais cidadãos.

Tais iniciativas são relativamente fáceis de passar no Congresso, pois não disputam recursos no Orçamento da União, já que os descontos são compensados por aumento das tarifas dos demais consumidores de energia elétrica.

Com os incentivos perversos acima descritos, não surpreende que, atualmente, haja 40 projetos de lei tramitando no Congresso Nacional propondo algum tipo de intervenção nas tarifas de energia elétrica. Há propostas de todo tipo, entre as quais: (i) desconto na tarifa de energia elétrica para moradores de cidades com geração termonuclear; (ii) isenção da tarifa para o consumo de bombas de poços artesianos; e (iii) isenção dos custos de transmissão para consumidores em municípios com usinas hidrelétricas.

Um exercício que deveria ser feito antes da concessão de qualquer benefício é a explicitação das suas implicações da perspectiva dos prejudicados. No caso dos três projetos de lei citados acima, por exemplo, os prejuízos poderiam ser explicitados da seguinte forma: (i) elevação da tarifa dos moradores das cidades sem geração termonuclear; (ii) majoração das tarifas dos consumidores que não utilizam poço artesiano; e (iii) aumento da tarifa de transmissão para consumidores de energia elétrica em municípios sem hidrelétricas.

O governo e os legisladores – finalmente – reconheceram essa distorção absurda quando promulgaram, em 2016, a Lei 13.360, que passa a requerer a elaboração de um “plano de redução estrutural das despesas da CDE”, estabelecendo um rito orçamentário anual, critérios para priorizar despesas e instrumentos para restringir as despesas aos limites pré-estabelecidos.

Além disso, o Ministério de Minas e Energia acaba de encerrar a Consulta Pública 45/2018, que apresentou propostas para disciplinar as despesas da CDE. A proposta em elaboração prevê, entre outras medidas: (i) a exigência de contrapartidas dos beneficiados em troca do direito recebido; (ii) o foco nos beneficiados, com regras de enquadramento mais restritivas; (iii) a eliminação de sobreposições que redundam na cumulatividade de benefícios; e (iv) o estabelecimento de prazos para a duração dos benefícios.

As iniciativas acima do Congresso e do governo são fundamentais e merecem todo o nosso apoio porque esse emaranhado sem fim de benefícios e subsídios não apenas onera as tarifas da maioria dos consumidores, como também interfere na lógica da estrutura tarifária, ocasionando distorções, ineficiências e injustiças.

Encargos tarifários regidos por princípios e por um processo orçamentário aberto e transparente contribuirão para a construção de um país mais justo e eficiente.

Claudio J. D. Sales e Richard L. Hochstetler são do Instituto Acende Brasil (www.acendebrasil.com.br)

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