Opinião

O custo da transição energética

Se não houver incremento nos investimentos em gás natural, a transição energética na velocidade necessária corre o risco de ser postergada, dando lugar para outros combustíveis fósseis com maior intensidade de emissões continuarem sendo supridores de energia

Por Levi Souto Jr.

Compartilhe Facebook Instagram Twitter Linkedin Whatsapp

O crescimento de novos projetos de energia renovável vem aumentando rapidamente no mundo, ainda assim, de acordo com as estimativas da Bloomberg NFE (2023), é necessário triplicar a capacidade de energias renováveis até 2030.

As fontes renováveis predominantes nas próximas décadas serão as eólicas e solares. Estas tecnologias, embora renováveis, apresentam a característica de serem não-controláveis, o que representa um desafio para o operador do sistema em manter a segurança elétrica. Esse desafio se torna mais evidente em momentos nos quais é necessário gerenciar a carga simultaneamente com as variações decorrentes da intermitência dessas fontes não-controláveis. 

Previsão de crescimento das energias renováveis (Fonte: Bloomberg NEF 2023)

Para dar suporte a esse crescimento de forma segura e com menor intensidade de emissões de GEE por energia gerada (MW/tCO2eq), a energia firme, característica das usinas hidrelétricas com reservatórios e termelétricas a gás natural flexíveis, deve ser utilizada em grande escala para prover o serviço de ponta e complementaridade às fontes eólicas e solares.

No âmbito das termelétricas, o gás natural é considerado estratégico para confiabilidade do sistema até que novas fontes de energias firmes sejam viáveis economicamente e atinjam a escala necessária, tais como bateria, hidrogênio e biocombustíveis.

Prova da relevância do gás natural, é que, como ilustrado na figura a seguir, a sua demanda continuará a crescer até, pelo menos, 2030, conforme o cenário de redução de GEE.

 

Cenários de demanda global de gás natural de diferentes instituições 2010 – 2050 (Fonte: Global Gas Report, Internacional Gas Union - IGU, out/2023)

Destaca-se que, devido à pressão nos últimos anos sobre o uso de combustíveis fósseis, os investimentos em gás natural vêm diminuindo. Há um apelo claro para maiores investimentos em gás no longo prazo, mesmo para o cenário da meta climática estabelecida pelo Acordo de Paris de 1,5°C.

Neste cenário, de acordo com a da Rystad Energy, os investimentos mundiais anuais em gás natural estão em torno de US$ 300 a 400 bilhões entre 2023 e 2030 e, depois, diminui para US$ 80 bilhões em 2050, no entanto, este cenário traz um maior nível de incerteza referente a velocidade da transição energética.

Investimento anual global em CAPEX de gás natural em diferentes cenários de redução dos GEE, Rystad Energy, real 2022 (Fonte: Global Gas Report, Internacional Gas Union - IGU, out/2023)

Mesmo o cenário de 1,5°C, com crescimento das renováveis mais rápido, mostra a importância do gás no panorama energético para a transição para as energias renováveis. Já os cenários de 1,6°C, 1,9°C e 2,2°C da Rystad Energy, mostram a necessidade de aumentar os investimentos em gás ainda mais no curto e médio prazo.

Diante disso, acende-se uma luz amarela: se não houver incremento nos investimentos em gás natural, a transição energética na velocidade necessária corre o risco de ser postergada, dando lugar para outros combustíveis fósseis com maior intensidade de emissões continuarem sendo supridores de energia.

Outro sinal amarelo que aparece, é que para atingir as metas de diminuição da temperatura, no cenário de 1,5°C, 2.800 GW de nova capacidade renovável deve ser adicionada a cada ano até 2030, que demandará investimentos anuais de US$ 3,5 trilhões - isso é mais de quatro vezes o investimento atual!

Investimento anual global em CAPEX em energia renovável e adição de capacidade em renovável em diferentes cenários de redução dos GEE, Rystad Energy (Fonte: Global Gas Report, Internacional Gas Union - IGU, out/2023)

Dado os investimentos expressivos requeridos nos próximos 25 anos, é importante que o mercado de capitais esteja preparado, pois há o risco de que players do setor de energia apresentem limitações quanto às suas capacidades de investimento.

Por outro lado, se a transição for mais lenta, como no cenário 1,9°C da Rystad Energy, esse desafio é minimizado pois os investimentos seriam aproximadamente 5 vezes menores (comparado com o cenário de 1,5° C) com uma adição média de capacidade de geração renovável de aproximadamente 500 GW ao ano (figura acima).

Portanto, a combinação realista de diferentes tecnologias e a velocidade sensata da transição são fundamentais para alcançarmos um cenário Net zero de forma segura e com a disponibilidade de recursos necessários.

Levi Souto Jr. é sócio fundador da Arpoador Energia. Possui mais de 20 anos de experiência em desenvolvimento de projetos de geração de energia, leilões de energia, M&A, licenciamento ambiental, negociação de contratos EPC, O&M e FSA.

Outros Artigos