Opinião

A silenciosa ascensão chinesa na indústria renovável

A capacidade chinesa em oferecer produtos com preços competitivos no setor de energia renovável – que se estende desde painéis solares até baterias de lítio – pode dificultar a autonomia de países que desejam se eletrificar independentemente

Por Heitor Paiva

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A China tem expandido a sua capacidade de ofertar produtos altamente demandados para a eletrificação da economia mundial. Em um momento no qual países se debruçam para diminuir a sua pegada de carbono, o poder de barganha de Pequim não apenas tem aumentado como se tornou gigante. E talvez seja tarde demais para ignorar isto.

A ascensão da China como o maior importador de petróleo trouxe mudanças significativas à ordem energética mundial, notadamente durante a primeira década do presente século. Pequim atualmente se beneficia do petróleo barato da Rússia e tem negociado o aumento do fornecimento do gás com Moscou. Fatos como estes são amplamente conhecidos. O mesmo, no entanto, não se pode dizer quanto à silenciosa promoção de Pequim como uma potência chamada “renovável”.

O controle dos chineses sobre as cadeias de fornecimento e refino de matérias-primas usadas na manufatura de baterias usadas em veículos elétricos é inquestionável. Dados recentes da Comissão Europeia apontam que quase 98% de todos os metais raros importados pela União Europeia vieram da China no ano de 2021. Algo que não é difícil de se acreditar, sobretudo quando se considera que o país detém quase 60% das reservas mundiais destas commodities. Não à toa, muitos observadores não descartam o risco de que cadeias de fornecimento deste ramo sejam alvo de barganha militar, como ocorrido com o petróleo nos anos 1970 ou com o gás natural na Europa durante o ano de 2022.

Pode-se avaliar que, por parte das grandes potências ocidentais, houve uma tardia percepção das consequências da preponderância chinesa nas cadeias de fornecimento de baixo carbono. Esta urgência fez com que o governo norte-americano, por exemplo, buscasse retomar o controle da oferta desta indústria com o recente ‘Ato de Redução da Inflação’. A princípio, destinaram-se mais de US$500 milhões para atividades mineradoras de metais raros em solo dos EUA. O alvo são metais usados na eletrificação da frota veicular, como cobalto, lítio e cobre.

Talvez este esforço não consiga reparar imediatamente este atraso. Especialmente porque a capacidade chinesa em oferecer produtos com preços competitivos no setor de energia renovável – que se estende desde painéis solares até baterias de lítio – pode dificultar a autonomia de países que desejam se eletrificar independentemente. Esta constatação não é de hoje. Lembremo-nos de que a petrolífera BP saiu do ramo da manufatura de placas de energia solar, em 2011, pela excessiva competitividade chinesa no ramo.

É neste sentido que classificar a China como o ator mais importante do setor de materiais para a transição energética não é exagero. Muitos já equiparam a sua influência à que a OPEP+ tem em relação ao mercado de petróleo internacional, mesmo que os jornais ainda não tenham dado a devida importância para isto. Certamente a geopolítica da energia será um tópico bastante recorrente nos próximos anos – algo que, para nós, apenas resta esperar.

 

Heitor Paiva é analista de mercado e atua com inteligência e pesquisa no mercado de câmbio e commodities, principalmente através de análise fundamentalista aplicada às commodities energéticas. Escreve na Brasil Energia a cada dois meses

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