Opinião

Geração própria de energia: fim das incertezas e novos rumos em 2023

A autoprodução de energia no mercado livre é uma oportunidade para as empresas que ao longo dos últimos 5 anos surfaram na onda da GD, explica em artigo Thiago Bao Ribeiro

Por Thiago Bao Ribeiro

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Desde sua ampliação em 2015, a da Geração Distribuída (GD) passou por diversas mudanças regulatórias. Após um período de intensos debates entre consumidores, distribuidoras e a Aneel, a Lei 14.300, de 2022, surgiu como uma esperança para a solução das incertezas da Resolução Normativa n.º 482, de 2012, e suas alterações. Com inúmeras lacunas, a Lei gerou mais insegurança jurídica do que certeza para os consumidores em 2022.

O marco regulatório da geração própria buscava equilibrar a queda de braço travada entre a agência reguladora e o mercado. Infelizmente, esse resultado não foi alcançado.

Recém publicada, a Resolução Normativa n.º 1.059, preencheu algumas lacunas da Lei 14.300, criando novas objeções no segmento, especialmente sobre o pagamento da TUSDg na microgeração, as vedações sobre os consumidores do grupo A que optaram pelo faturamento do grupo B (B optante).

Essas regras trouxeram uma mudança significativa na compensação da energia elétrica. Em média, considerando as 58 principais distribuidoras e tarifas Grupo B - Convencional, a compensação sofre uma redução gradual média de 31%, representando TUSD Fio B, e uma redução média de 36%, representando TUSD Fio B, 40% da TUSD Fio A, TUSD P&D e TE P&D. O valor da redução varia de acordo com as características da modalidade de compensação.

Por outro lado, a mudança da cobrança da TUSDdemanda (TUSD C) para TUSDg dependendo da concessionária, pode chegar a uma redução de 78%, por exemplo na Celesc (SC). Em Minas Gerais, a redução é 43%.

Com as novas regras de compensação de energia elétrica em vigor, muitos integradores têm dúvidas sobre como explicar essa mudança aos seus consumidores. Além disso, a viabilidade de projetos de geração distribuída pode ser impactada e é importante estar preparado para a mudança de regra.

Mas será que a geração distribuída ainda é um investimento viável? Qual é a dimensão do mercado de energia solar? Estas são algumas das questões que buscaremos responder neste artigo.

Para onde caminhará a GD após a regulamentação da Lei 14.300?

Com uma regra de direito adquirido, que garantia aos acessantes o direito de não pagar o fio B até 2045, o mercado criou a “teoria do fim do mundo”, que pregava o fim da GD a partir do dia 07 de janeiro de 2023. Essa estratégia gerou muita demanda em 2022, no entanto, criou um cenário de insegurança para os investimentos neste ano.

Embora a rentabilidade das distribuidoras seja afetada pela crescente penetração da energia solar na geração distribuída, esse é um problema comum em todo o mundo. Se a Aneel tivesse implementado a tarifa binômia na baixa tensão, o debate sobre o custo do fio B seria mais transparente e já conhecido.

A campanha da "taxação do sol" tem causado desconfiança dos consumidores, pois quem não conseguiu solicitar o acesso a rede da distribuidora até 07/02/2023, hoje está receoso de investir no setor. Com a conjunção de fatores como a "teoria do fim do mundo" e as condições econômicas do Brasil, onde a taxa de juros está em torno de 13,75%, o segmento de geração distribuída tem sofrido uma queda nas vendas.

Mas para onde vai a GD? E quais são os novos rumos do setor de geração de energia renovável no Brasil, especialmente a energia solar, que avança de forma exponencial?

A Geração Distribuída não vai acabar. Pelo contrário. A energia solar tem maior penetração que as demais fontes renováveis disponíveis, especialmente considerando os desafios operacionais da matriz energética brasileira. Há inúmeras oportunidades no mercado de geração de energia solar que têm relação direta com os projetos de GD.

A geração distribuída foi fundamental para criar o conceito de geração própria, permitindo que pessoas comuns gerarem sua própria energia e conscientizando o mercado sobre a importância de consumir fontes renováveis. Além disso, abriu um mercado antes inexistente e distante do público médio, possibilitando a implantação de usinas para recebimento de receita recorrente.

Quais são as tendências do mercado de energia solar para 2023?

Apesar das incertezas geradas pela regulamentação da Lei 14.300, o mercado de energia solar apresenta muitas oportunidades para investidores e consumidores.

A nova regra de transição prevê um pagamento gradual da TUSD Fio B, não diminui a atratividade dos sistemas de geração de energia solar para o consumidor final. Especialmente para sistemas de geração local, que representam 81% da potência instalada, o impacto no retorno do investimento é baixo. Já para empreendimentos de geração remota, o impacto na atratividade é maior.

A Geração Distribuída continua crescendo e a classe residencial tem se destacado, representando 56% do volume adicionado em 2022. A classe comercial também tem aderido, sendo responsável por 22% do avanço da GD.

A energia solar não está restrita apenas à geração distribuída

A tendência para 2023 é a geração em conjunto com a carga, especialmente para evitar o pagamento do fio B e de tributos sobre a energia compensada. Há muitos consumidores interessados em produzir sua própria energia, incluindo galpões logísticos, frigoríficos, hotéis de verão e centros de distribuição.

Com isso, além da GD, a Autoprodução de Energia (APE) surge como alternativa para os mercados em que a geração distribuída não seja a melhor opção para o consumidor. 

A abertura do mercado livre de energia pelo Projeto de Lei n.º 414 abrirá caminho para novos investimentos e crescimento da energia solar. A Autoprodução de Energia no mercado livre é uma oportunidade para as empresas que ao longo dos últimos 5 anos surfaram na onda da geração distribuída, especialmente para atender o comércio e a Indústria que estão na média tensão, que têm operações diurnas, telhados disponíveis e um interesse em se tornar autoprodutores de energia.

A GD deve ser restrita à baixa tensão, enquanto a APE deve ser a tendência do Grupo A.

A relevância da simultaneidade para a viabilidade dos projetos

Uma das previsões para o mercado de energia solar em 2023 é o crescimento da simultaneidade entre a geração e o consumo de energia elétrica. Isso significa que os consumidores terão mais autonomia e poderão usar a energia gerada pelos seus sistemas fotovoltaicos de forma imediata, reduzindo a dependência da rede elétrica.

Essa mudança é impulsionada pelo aprimoramento contínuo dos sistemas fotovoltaicos, que permitem gerar mais energia em menos espaço, e pela evolução dos sistemas de armazenamento de energia, como as baterias solares. Com esses sistemas, os consumidores podem armazenar a energia gerada durante o dia e usá-la à noite, quando a demanda é maior.

É importante destacar o conceito de "energia evitada" que se refere à geração de energia simultânea com o consumo. Esse fator é crucial para a usina solar em conjunto com a carga, seja na Geração Distribuída ou na Autoprodução de Energia, pois pode economizar na TUSD volumétrica (kWh) e nos tributos que são cobrados do consumo direto da rede. Na APE, a geração fora do local de consumo tem benefícios tarifários que compensam a autoprodução.

Oportunidades de mercado para serviços de energia por assinatura

O mercado também está mostrando uma tendência para os serviços de energia por assinatura. As empresas com grandes bases de clientes, como as telecoms, fintechs de crédito e grandes varejistas, podem explorar esse mercado oferecendo serviços de energia por assinatura. As cleantechs ou energytechs surgem com soluções tecnológicas para reduzir os custos de aquisição de clientes e aumentar as margens dos geradores.

As grandes varejistas estão investindo nessas startups, criando suas próprias subsidiárias de geração distribuída para fornecimento de energia aos seus clientes cativos. Essas empresas têm como objetivo destacar o compromisso das empresas em investir em produtos inovadores e disruptivos, que ofereçam soluções de energia acessíveis, flexíveis e escaláveis, em resposta à constante evolução que o setor está vivenciando globalmente.

A Ambev firmou parceria com a startup Lemon, e viu seus parceiros economizarem mais de R$ 500 mil nas contas de luz. A expansão chegou ao Sul de Minas Gerais, na região de Alfenas, Varginha e Pouso Alegre. A ideia é democratizar ainda mais a geração compartilhada e colocar o pequeno consumidor como agente ativo no setor elétrico. A economia faz toda a diferença para o pequeno empresário em sua retomada econômica e a Ambev oficializa a sua participação em um setor com grande potencial de crescimento. 

As questões relacionadas às EGS também impulsionam o mercado, já que as empresas poluidoras precisam se descarbonizar e a contratação de energia na GD ou na APE é uma forma de atingir seus objetivos de descarbonização.

Expandindo os negócios de energia solar com a mobilidade elétrica e leasing operacional

Um outro mercado que surge por conta da sustentabilidade é o de veículos elétricos e representa uma grande oportunidade para os integradores de equipamentos fotovoltaicos. Os clientes que buscam sistemas de geração distribuída fotovoltaica também têm interesse na mobilidade elétrica, ampliando as possibilidades de negócio. Para poder oferecer soluções completas aos clientes, os integradores de equipamentos fotovoltaicos devem estar capacitados e ter conhecimento sobre os tipos de carregadores para veículos elétricos.

Uma boa alternativa é buscar parcerias com fabricantes de carros elétricos ou com empresas de carregamento de veículos elétricos para oferecer soluções integradas aos seus clientes.

Além disso, todos esses movimentos criam um novo mercado para distribuidores e integradores de equipamentos para geração de energia solar, como o Leasing Operacional de aluguel de equipamentos. O aluguel de equipamentos, com opção de compra no final, é uma alternativa para mitigar os riscos de investimento do consumidor, quebrando as principais objeções para o investimento em um sistema próprio.

Além disso, o leasing também oferece outras vantagens, como a manutenção dos equipamentos por parte da empresa fornecedora e a possibilidade de atualização tecnológica dos painéis solares ao final do contrato.

Para as empresas fornecedoras de equipamentos solares, o leasing é uma oportunidade de ampliar sua base de clientes e oferecer uma alternativa mais acessível para aqueles que desejam adotar a energia solar. Além disso, o leasing também pode ser uma fonte de receita recorrente, já que os consumidores geralmente renovam seus contratos ou optam pela compra dos equipamentos no final do prazo.

É importante que as empresas do setor estejam preparadas para se adaptar às mudanças e aproveitar as oportunidades que surgirem. No entanto, mesmo com todas as mudanças e incertezas, a GD ainda apresenta muitas oportunidades para investidores e consumidores. A energia solar, em particular, é uma fonte promissora e cada vez mais acessível, o que impulsiona o crescimento da própria como um todo.

Para tomar as melhores decisões, é fundamental que investidores e consumidores estejam atentos às mudanças no setor e busquem orientação de profissionais especializados.

Thiago Bao Ribeiro é advogado e sócio do escritório Bao Ribeiro Advogados, com foco em estruturação jurídica de projetos de geração de energia renovável

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