Opinião

A Geração Distribuída Compartilhada

A proposta da Aneel de regulamentar a geração compartilhada traz à tona a necessidade de equilíbrio entre a facilitação do acesso à geração distribuída e a prevenção de práticas que possam distorcer o mercado.

Por Thiago Bao Ribeiro

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A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) concluiu recentemente o processo de Tomada de Subsídios 018/2023, marcando um momento crucial na evolução da legislação brasileira sobre a geração distribuída compartilhada.

Este processo, fundamentado no Artigo 28 da Lei nº 14.300/2022, busca refinar as normativas relacionadas à proibição de comercialização de energia dentro do Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE).

A iniciativa da Aneel não apenas destaca a importância da regulamentação em sintonia com as necessidades emergentes do segmento de GD, mas também reflete o compromisso contínuo com atualização do regulamento.

Entendendo o Contexto

A iniciativa busca colher insights de consumidores e profissionais para refinar a compreensão e a regulamentação das práticas de mercado, assemelhando-se à comercialização de energia no SCEE. O objetivo é assegurar que as normativas estejam alinhadas com a promoção da geração distribuída, a proteção dos direitos dos consumidores e a eficiência do mercado.

Análise das Questões Chave

A Aneel propôs nove questões-chave, abordando desde a caracterização da comercialização de energia no SCEE até as condições para a comprovação da posse ou propriedade de centrais de micro ou minigeração distribuída. Essas questões são cruciais para uma regulação eficaz, destacando a importância da clareza nas definições e requisitos para uma participação equitativa e justa no mercado de energia.

Implicações para o Setor de Energia

A clara distinção entre o que é considerado comercialização de energia e as práticas permitidas é vital para o desenvolvimento sustentável do setor. Além disso, a flexibilização na comprovação de posse ou propriedade dos equipamentos geradores por parte dos consumidores promove a acessibilidade e a viabilidade da geração distribuída.

Opinião Sobre a Regulamentação da Geração Compartilhada

A proposta da Aneel de regulamentar a geração compartilhada traz à tona a necessidade de equilíbrio entre a facilitação do acesso à geração distribuída e a prevenção de práticas que possam distorcer o mercado.

A abordagem da Aneel, que proíbe a remuneração em reais por unidade de energia elétrica gerada em contratos de aluguel ou arrendamento de terrenos com micro ou minigeração, é prudente. Esta medida busca evitar a transformação da geração compartilhada em uma atividade comercial que poderia desvirtuar os objetivos da geração distribuída, focados na sustentabilidade e no empoderamento dos consumidores. A preocupação da Aneel com a potencial comercialização de energia no Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE) é válida, dada a importância de preservar o caráter colaborativo e não comercial deste modelo.

À luz da legislação vigente, contratos de aluguel ou arrendamento, por exemplo, não devem ter contraprestação pecuniária baseada na unidade de energia elétrica gerada, refletindo a intenção de manter a essência da geração compartilhada como um modelo colaborativo e sustentável, sem desviar para a comercialização disfarçada de energia.

Por outro lado, a posição da Aneel de supostamente exigir dos consumidores a prova de posse ou propriedade dos equipamentos geradores viola a Lei 14.300/2022. Digo supostamente, visto que a Nota Técnica que gerou a Tomada de Subsídios insinua tal exigência. Vale notar que a legislação atual, especificamente o Artigo 10 da Lei 14.300/2022, já estabelece um equilíbrio ao delegar às distribuidoras a responsabilidade de verificar a documentação relacionada à posse do local de instalação das unidades geradoras, sem estender essa exigência à posse ou propriedade dos equipamentos.

A exigência de que a comprovação de participação na geração compartilhada se limite ao instrumento de admissão definido nos instrumentos de constituição das Associações, Consórcios e Cooperativas é um reconhecimento da autonomia dessas entidades. Este enfoque respeita as estruturas organizacionais desses grupos e evita a imposição de requisitos documentais excessivos que poderiam dificultar a formação e operação de iniciativas de geração compartilhada.

De acordo com a minha análise da Lei 14.300/2023, a prática de rateio dos custos associados à geração de energia entre os participantes de Associações, Consórcios ou Cooperativas reflete um modelo de compensação justo e equitativo. Esse método garante que a remuneração do investimento em sistemas de geração distribuída seja proporcional ao uso e ao benefício recebido pelos consumidores, sem caracterizar venda de energia. A oferta de descontos sobre a tarifa da distribuidora, confirmada pela Aneel como uma prática válida em precedentes da Agência, confirma essa forma de estruturar a geração compartilhada e descaracteriza qualquer tipo de atividade de comercialização de energia via GD.

Em suma, a regulamentação da geração compartilhada pela Aneel é uma iniciativa louvável que busca promover a segurança jurídica do segmento de GD. No entanto, é crucial que essa regulamentação seja implementada de maneira a respeitar os direitos dos consumidores e promover a viabilidade da geração distribuída. Ao equilibrar os interesses dos diferentes stakeholders, a Aneel pode desempenhar um papel fundamental em direcionar o Brasil para um futuro energético mais sustentável e inclusivo.

 

 

Thiago Bao Ribeiro é advogado e sócio do escritório Bao Ribeiro Advogados, com foco em estruturação jurídica de projetos de geração de energia renovável. Escreve na Brasil Energia a cada dois meses.

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