Opinião

Além da nova estratégia comercial da Petrobras

Manutenção de previsibilidade nos preços dos derivados do petróleo depende de elementos como a gestão de ativos e a regulação do mercado de óleo e gás no Brasil, tendo a Petrobras um papel central

Por Osmani Pontes

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Na condição de maior empresa do setor de petróleo e gás do país e responsável pelo maior volume de investimento das contas nacionais, inevitavelmente a Petrobras desempenha um papel vital no combate à volatilidade do preço dos derivados do petróleo no abastecimento do mercado interno. E isso envolve alguns ativos-chave para serem analisados.

Ao longo do primeiro trimestre circulou a informação, posteriormente negada pelas partes, de que o fundo Mubadala, gestor da Acelen, teria interesse na Braskem que pertence à NovoNor (47% das ações) e à Petrobras (36%). O interesse seria tamanho que o fundo teria oferecido à Petrobras ações da refinaria de Mataripe (BA) em troca de ações da Braskem. O negócio não foi adiante e, ao contrário, a Petrobras teria demonstrado interesse em comprar mais participações na Braskem, bem como na Vibra, nesse caso por discordar de como foi conduzida a privatização do setor de distribuição, em que a antiga BR deixou de ser da companhia. Ambas as aquisições impactariam negativamente o volume de dividendos a ser distribuído.

Isso revela elementos ligados à visão da atual gestão da Petrobras, que identifica erros regulatórios dos processos de privatização de partes da cadeia de óleo e gás entre os quais está a privatização da antiga refinaria Landulpho Alves, hoje Mataripe. Era sabendo dessa insatisfação que o dono da Acelen teria oferecido ações em troca da Braskem.

O ponto é que como a refinaria, que responde por 10% do refino nacional, está isolada, não sofre concorrência e não repassa reduções de preço definidas pela Petrobras na esteira da nova política de preços. Isso porque, mesmo que haja outra refinaria disposta a reduzir o preço, os custos de frete, logística e distribuição fariam o preço final ficar mais caro na bomba. Há, portanto, uma barreira à entrada de concorrentes. Por isso que na maior parte dos postos do estado da Bahia, as reduções de preços dos combustíveis não acompanharam o restante do país.

Há mais problemas na relação da refinaria com a questão dos preços no mercado interno que podem bater até no Ministério da Fazenda. Isso porque as refinarias privatizadas pagam PIS e Cofins na compra de óleo cru, mas não podem creditar esse imposto na venda de diesel, gás e querosene de aviação. Há uma pressão contida para que possam repassar esse crédito, o que teria efeitos inflacionários, além de ir contra a simplificação tributária, pilar da reforma tributária do governo. Caso essa reivindicação não seja atendida, há a ameaça de redução da compra de óleo cru, o que poderia trazer problemas para o abastecimento do mercado doméstico.

Esses problemas podem abranger também a opção da refinaria em exportar derivado refinado ou avançar no processo de transformação em biorefinaria. Ambas as escolhas teriam efeito similar de desabastecimento do mercado interno.

É válido destacar que o texto da reforma tributária recentemente encaminhado ao Senado versa sobre a possibilidade de crédito na venda como forma de mitigação de cumulatividade. Porém, a transição será gradual, sendo que em 2026 a alíquota do CBS (IVA que substitui em 2027 o PIS, PIS importação, Cofins e Cofins importação) será de 0,9%. Assim, não são esperados impactos relevantes nos planos de investimentos para o próximo biênio.

É possível também que não só a Acelen, mas gestoras de outras refinarias solicitem isenção desses tributos até que o IVA esteja integralmente aplicado. Porém, isto envolveria aspectos políticos mais relevantes, já que afetaria as importações da Petrobras e eventualmente sua função de produção, e também todas as refinarias do país.

No quadro atual, uma solução seria o Ministério da Fazenda ignorar e supor que, como o preço é rígido para baixo, não valeria a pena a permissão de crédito na venda até 2027. De fato, nada impede que, diante do monopólio, mesmo com o desconto sobre a tributação na venda, a refinaria poderia aproveitar para aumentar suas margens e não mexer no preço. Mas o tensionamento seguiria, já que o governo da Bahia vem concedendo incentivos fiscais para a refinaria expandir a produção, em linha com a ideia da Petrobras de aumentar o refino por meio de plantas já existentes.

Assim, o cenário que se coloca leva a Petrobras e as demais produtoras de petróleo a avaliar qual a melhor forma de gestão dos ativos (sobretudo refinarias) para simultaneamente atender à otimização da produção e às restrições tributárias e de custos operacionais. As decisões sobre a melhor forma de entrada da Petrobras na indústria bioquímica, via Braskem, e de aumento da utilização das plantas já instaladas nas refinarias passam por essa conjuntura.

 

Osmani Pontes é economista, com MBA em mercados de derivativos, opções e futuros pelo INSPER e em gestão de portfólios cambiais pela EPGE/FGV. Escreve mensalmente na Brasil Energia.

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